“Deixa os mortos sepultar os mortos” (Lucas 9:60)
O homem vive no tempo e a invenção do futuro é o seu jogo favorito de fuga.
Adiamos a morte porque adiamos a vida.
Os nossos problemas e sofrimentos se situam no nosso processo do vir a ser.
Por não vivermos no presente, aprendemos que a morte é algo no futuro.
Por desejarmos à permanência a morte se tornou nossa inimiga.
Por acreditarmos na culpabilidade, a morte se tornou a sentença e o carrasco da vida.
Por acreditarmos no perdão a morte se tornou a porta de entrada do paraíso.
Por necessitarmos de espaço e renovação, a morte é a operária da transformação.
Por termos o pensamento fragmentário separamos a morte da vida e lhe rendemos homenagem separadamente.
Tememos a morte por que tememos o novo.
A padronização, o conforto do supostamente conhecido nos dá a ilusão da segurança, por mais nociva que seja a sua realidade no cotidiano da vida.
Experimentar o diferente nos trás a culpa decorrente da crença na infidelidade para com o usual. Não precisamos cometer suicídio físico, a morte é uma programação da vida. Mas quantas vezes não passamos pelo suicídio emocional no processo de autocompaixão pelo egoísmo da permanência.
A morte se torna um problema, pois nosso pensamento em sua imagem a transforma num problema.
A imagem da perda, a imagem do passado, a memória ruminando na lamentação, o pensamento girando na continuidade do tempo.
E o pensamento cria todo tipo de misticismos e crenças como solução ao desconhecido. Gastamos mais energia na manutenção da memória do que na criação do novo. Sofremos por não querermos perder e culpamos a morte.
O programa de memória do eu tem medo da morte, pois acredita que a mudança de paradigma é o seu fim.
A vida como um costume pode se transformar num sepultamento vivo e levar ao desespero do novo, transformando a morte em uma porta de libertação.
Não devêssemos temer e criminalizar a morte, mas a violência para com a vida.
E a morte em uma sociedade de consumo é o grande nicho de mercado. A abusiva violência do valor que os produtores dos rituais do fim praticam, mas isto é outro caso.
Quando separamos o viver e o morrer criamos um intervalo de tempo que gera o medo. Então tenha uma boa vida e uma boa morte.
Nossa mente deve morrer todos os dias psicologicamente para abrir espaço ao novo. Saiba viver e morrer. Tudo que existe está fadado ao fim que é o começo.
“Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer produz muito fruto” (João 12.24)
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