CYPHERPUNKS A LIBERDADE E O FUTURO DA INTERNET
“É preciso acionar o alarme. Esse livro é o grito de advertência de uma sentinela na calada da noite”, escreve Assange na introdução.
A internet possibilitou verdadeira revolução no mundo todo, mas a previsão de Assange é uma grande onda de repressão no mundo online, a ponto de considerar a internet como uma possível ameaça à civilização humana devido à transferência do poder de populações inteiras a um complexo de agências de espionagem e seus aliados corporativos transnacionais que não precisarão prestar contas pelos seus atos. Em contrapartida, propõe o lema “privacidade para os fracos e transparência para os poderosos”. Resultado de reflexões de Assange com um grupo de pensadores rebeldes e ativistas que atuam nas linhas de frente da batalha em defesa do ciberespaço, o livro reflete sobre a vigilância em massa, censura e liberdade, mas o principal tema é o movimento cypherpunk, que faz uso da criptografia como mecanismo de defesa dos indivíduos perante a apropriação e uso bélico da internet pelos governos, Estados e empresas. Os cypherpunks defendem a utilização da criptografia e métodos similares como meios para provocar mudanças sociais e políticas. O movimento teve início em 1990, atingiu o auge de suas atividades durante as “criptoguerras” e, sobretudo, após a censura da Internet em 2011 na Primavera Árabe. O termo cypherpunk, uma derivação (criptográfica) de cipher (escrita cifrada) e punk, foi incluído no Oxford English Dictionary em 2006. “Uma guerra furiosa pelo futuro da sociedade está em andamento. Para a maioria, essa guerra é invisível”, alerta Julian Assange, fundador do WikiLeaks, na apresentação do seu programa de entrevistas World Tomorrow, realizado em parceria com a rede de TV russa WT – e que serviu de base para este livro. “De um lado, uma rede de governos e corporações que espionam tudo o que fazemos. Do outro, os cypherpunks, ativistas e geeks virtuosos que desenvolvem códigos e influenciam políticas públicas. Foi esse movimento que gerou o WikiLeaks”. A batalha travada pelo WikiLeaks é tanto política quanto tecnológica. A organização representa um marco importante ao disponibilizar, por princípio, toda a base documental de suas publicações. Além de divulgar documentos, o WikiLeaks produziu dezenas de matérias, vídeos e artigos de opinião. Por outro lado, no jornalismo tradicional são poucos os veículos que disponibilizam todo o material‑base de suas reportagens para que seja escrutinado e reutilizado pelo público. A indústria da notícia é uma das principais trincheiras na disputa sobre o vasto mundo da internet. Na era da internet qualquer um pode ser produtor de notícia. O WikiLeaks avança ao trazer a possibilidade de dezenas de veículos independentes, jornalistas e usuários se apropriarem de documentação, se tornando provedores de jornalismo de qualidade, com base no jornalismo investigativo ao valer‑se dos segredos de Estado, documentos que comprovam violações de direitos humanos por empresas, o rastro documental dos crimes dos poderosos. Apesar da noção hacker intrínseca na maneira de o WikiLeaks praticar jornalismo aliando-se a veículos tradicionais de mídia, bem como a veículos não tradicionais, ela incentiva a disseminação de conteúdos livres, fora dessa indústria. Redes sociais como o Facebook, Google são apontados como “a maior máquina de vigilância que já existiu”. O debate argumenta que as agências de espionagem dos EUA têm acesso a todos os dados armazenados por Google e Facebook – vistos como “extensões dessas agências”. “É uma maluquice imaginar que entregamos nossos dados pessoais a essas empresas e que elas se transformaram basicamente em uma polícia secreta privatizada”, afirma Jacob Appelbaum, fundador da Noisebridge. “A internet, nossa maior ferramenta de emancipação, está sendo transformada no mais perigoso facilitador de totalitarismo que já vimos. A internet é uma ameaça à civilização humana”, afirma o editor, que enxerga uma militarização do ciberespaço: “Quando nos comunicamos pela internet ou por telefonia celular, nossas trocas são interceptadas por organizações militares de inteligência. É como ter um tanque de guerra dentro do quarto”, diz. O escritor faz uma defesa da auto-gestão ou autonomismo e com uma metralhadora giratória do texto ataca poderes políticos e econômicos fazendo parecer brincadeira de criança a imaginação de George Orwell. No debate transcrito, surgem temas como censura, direito autoral e pornografia infantil. E são relatados casos de softwares que, por exemplo, impedem que funcionários tenham acesso a sites de sindicatos que informem sobre seus direitos trabalhistas. Cuidado: você está sendo vigiado e manipulado. Essa é a mensagem que fica da leitura de “Cypherpunks, Liberdade e o Futuro da Internet”, novo livro de Julian Assange. E o homem transferiu para o cyber espaço todo seu mundo de segredos, reproduzindo online sua mediocridade moral em busca da liberdade.
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